O Facebook ainda é a principal rede social do mundo, mas muitas pessoas insistem em dizer que a plataforma morreu ou irá morrer em breve.

Acredito que muitas pessoas tem a sensação que o Facebook morreu porque elas associam relevância com o impacto na mídia. Isso acontece porque o TikTok, Instagram, Youtube e até mesmo o Twitter tem uma porcentagem considerável de mídia e impacto gerado por criadores de conteúdo.

Quando foi a última vez que ouvimos falar de um “influenciador no Facebook”? Essa recordação provavelmente não existe na memória da maioria das pessoas.

Por conta desse cenário, as pessoas associam o fato do Facebook não ser mais comentado, com o fato da rede estar morrendo, o que é compreensível. Em termos de impacto na mídia, a presença do Facebook realmente perdeu muita relevância quando comparada com Instagram, Whatsapp, TikTok e Youtube.

Hoje 1,8 bilhões de pessoas usam os grupos do Facebook. Então apesar do crescimento no número de usuários, a percepção é outra. Um ponto que favorece a utilização do Facebook são os grupos.  Eu costumo dizer que os grupos são as novas páginas do Facebook.

Queda no lucro líquido do Facebook


No relatório financeiro do Q3 de 2022 o Facebook apresentou um declínio na fatia de mercado e do lucro. Essa queda tem alguns motivos, mas vou focar nos principais:

  • O excesso de otimismo durante a pandemia;
  • Guerra da Ucrânia;
  • Desafios da nova era da privacidade.

Pandemia e Guerra na Ucrânia


Durante a pandemia, boa parte das empresas de tecnologia viu um crescimento massivo. A expectativa tanto de analistas como da gestão das empresas era de que as estimativas futuras se manteriam em constante crescimento após a pandemia.

Na prática as empresas aumentaram o número de contratações, projetos, previsão de receita e muito mais. O clima era otimista, apesar da pandemia.

O que ocorreu foi algo bem diferente, o cenário econômico voltou a níveis pré-pandemia, tivemos o início de uma guerra na Ucrânia e um outro fator pouco comentado foi a oscilação do Euro, além da ameaça constante de uma recessão global.

Antes da saída da Rússia, o Instagram tinha aproximadamente 67 milhões de usuários e o Facebook 37 milhões. De acordo com Dave Wehner, CFO da Meta, o país tem um impacto de 1,5% no faturamento total dos anúncios.  

É interessante notar que praticamente todas as grandes empresas fizeram cortes e também contaram com estimativas extremamente otimistas por conta da pandemia e depois tiveram que reajustar.

A nova era da privacidade e a guerra contra a Apple

A Apple decidiu seguir por um caminho bem rigoroso e limitar de forma agressiva os sinais que os anunciantes eram capazes de captar na plataforma.

Na prática, se você faz um anúncio e uma pessoa usa iOS, você não consegue rastrear os dados, fica difícil atribuir o resultado de uma venda para um anúncio, por exemplo. Isso prejudica toda a análise de dados que a Meta, e outras empresas fazem para poder otimizar os anúncios.

Por conta dessa mudança e a forma como os dados são processados, a Meta teve que encerrar ferramentas que antes eram utilizadas para gerar mais informações para quem anuncia na plataforma.

Nas reuniões de acionistas da Meta, com frequência ouvimos sobre o impacto negativo da “perda de sinais”. Essa mudança obrigou a Meta a reconstruir sua plataforma de anúncios e criar novos métodos de personalização, entre eles o PET (Privacy Enhancing Technologies). Esse é um conjunto de ferramentas que permite que a Meta segmente os anúncios para um público específico, mas respeitando as regras de privacidade impostas pela Apple.

Acho válido ressaltar que o Google também passa por essa mudança, mas tomou uma abordagem bem diferente. O Google decidiu colaborar com as principais empresas do mercado durante esse período de mudança para garantir o bom funcionamento das ferramentas e sinais durante o processo.

Uma das ações amigáveis que o Google tomou foi adiar o fim dos cookies de terceiros para o Q3 de 2024 (esta data pode mudar no futuro). Então apesar da mesma mudança estar chegando no Google também, o impacto para a Meta e outras empresas será significativamente menor do que o impacto das mudanças feitas pela Apple.

Recentemente a Snap anunciou que irá reconstruir a plataforma de anúncios considerando este novo cenário. Isso deve acontecer com todas as plataformas, inclusive o TikTok.

O Facebook pode reverter a situação

Na última reunião de acionistas Mark Zuckerberg disse que o tema do ano era “o ano da eficiência”. E não foi só retórica, a Meta já iniciou uma série de medidas para redução de custos e aumento da eficiência. Na prática, cortes de funcionários, redução de camadas de gestão e otimização de espaços físicos.  Essas medidas iniciais foram o suficiente para animar o mercado a ponto das ações subirem mais de 20%.

Mas isso não deve acontecer a curtíssimo prazo. O ano de 2023 ainda é considerado um ano de recessão de acordo com as previsões internas da Meta, apresentadas na reunião de acionistas do Q3 2022.

Um outro sinal de que a Meta acredita na reversão é a compra de ações. A empresa também anunciou um plano de comprar  $40 bilhões das suas próprias ações, o que favorece os acionistas e manda um sinal muito positivo para o mercado.

Facebook vs TikTok

Apesar do crescimento considerável dos concorrentes, o Facebook se mantém como uma plataforma consolidada no mercado. O TikTok é quase 3x menor do que o Facebook (aplicativo mesmo) e 2x menor que o Instagram em números de usuários. Em termos de faturamento, a expectativa do TikTok era de faturar por volta de $10 bilhões em 2022, enquanto a Meta faturou $116 bilhões.

A maioria das pessoas não tem a menor ideia disso.

Agora, isso não tira de forma alguma o mérito do TikTok e o quanto ele tem crescido rapidamente. Apesar do faturamento de  $10 bilhões estar longe do faturamento da Meta, este número representa um aumento de um pouco mais de 100% em relação a 2021.

Tanto Facebook como Instagram continuam crescendo em número de usuários.

O Tiktok sem dúvida alguma é um produto melhor para vídeos na vertical, isso já foi reconhecido múltiplas vezes pela diretoria da Meta.

O que faz o Facebook continuar relevante é justamente isso, o fato deles não estarem parados esperando o TikTok tomar o mercado, mas fazendo adaptações, testes e mudanças em um nível exponencial para poder concorrer não só com o TikTok, mas outros concorrentes também.

Discovery Engine

A Meta está investindo em um motor de recomendação que se chama Discovery Engine, que basicamente seria o equivalente a um “cérebro” ainda mais potente que o do Tiktok, mas operando como uma camada para os produtos da Meta. Esse sistema de recomendação irá funcionar não somente para vídeos, mas para imagens, textos, links, grupos, produtos e tudo o que estiver dentro da Meta.

A grande virada do Instagram para concorrer com o TikTok ainda não aconteceu. Isso deve acontecer em algum momento entre o Q4 de 2023 e o Q1 de 2024. Neste momento, com o Discovery Engine aplicado, o volume de recomendações úteis da plataforma pode chegar a algo em torno de 30 a 40% de acordo com o Mark Zuckerberg.

O impacto disso? Uma distribuição de conteúdo semelhante ao que vimos no Tiktok nos primeiros anos da plataforma, mas com o dobro do potencial total devido ao tamanho do Instagram.

Então o que faz o Facebook continuar como uma plataforma consolidada é o fato deles não estarem parados enquanto a concorrência toma o mercado, eles jogam no ataque. E é justamente por isso que comparações do Facebook com Orkut, Myspace e outras empresas não é pertinente. O que a Meta está fazendo hoje, em termos de negócio, não tem precedente algum para ser comparado.

Comportamento da nova geração no Facebook vs TikTok

O Tiktok é uma rede nativa para os jovens. O conteúdo é  em vídeo, na vertical, rápido, divertido, chega a você sem esforço algum, não depende de você conhecer alguém, você sente que faz parte de algo participando de um movimento ou de uma trend.

A rede preencheu um espaço que não existia no mercado, mas que já havia sido validado antes pelo Vine e Snapchat. Até então, as redes sociais eram fortemente baseadas no gráfico social, ou seja, na sua rede de contatos, amigos e familiares. Com exceção do Youtube, que não era bem uma rede social tradicional, esse espaço estava completamente vazio.

Os jovens também tem aquele sentimento de não estar presente nos mesmos círculos sociais dos adultos e o TikTok chegou na hora certa, para o público certo. É interessante lembrar que o Facebook explodiu como rede social quando foi direcionado para jovens universitários, o Instagram popularizou os influenciadores em um nível jamais visto e agora o Tiktok disputa com o Instagram a atenção dos usuários mais jovens.

O Tiktok tem algo que eu acredito que nenhuma outra rede social tem: o sentimento de comunidade. O TikTok, por ter sido muito baseado em trends e desafios, deixa todo o aspecto da produção de conteúdo muito convidativa. As pessoas têm vergonha de postar no Instagram, mas não no TikTok. Lá as pessoas passam “vergonha” com prazer, o que é incrível, porque no final, todos podem se divertir juntos.

Pra mim, esse é o maior trunfo do Tiktok e o que a Meta vai ter mais dificuldade em lidar no futuro. A quantidade de conteúdo gerado por usuários no TikTok faz com que o conteúdo da rede fique cada vez mais rico e mais realista, mais vida real. Algo que hoje as pessoas buscam cada vez mais, uma visão mais crua da vida, sem processamento.

Eu ainda não vi um plano da Meta para aumentar o número de UGC (Conteúdo Gerado pelo Usuário). Esse é o ponto fraco do Instagram porque não está associado com faturamento, com recursos, com recomendação ou a experiência da plataforma. É o sentimento que as pessoas têm quando abrem o aplicativo e a expectativa de receber algo que não seja somente de um creator profissional, mas de uma pessoa comum, que não faz aquilo para viver, mas está compartilhando algo divertido e incrível pra ela.

Esse é o ouro do Tiktok e o motivo pelo qual não só os jovens, mas todas as faixas etárias se sentem tão atraídas pelo conteúdo. Nós sempre damos muito crédito para a inteligência artificial e a recomendação, mas a maior vantagem do TikTok não está na rede em si, está nas pessoas e como elas enxergam a rede.

Obs.: Vale notar que não temos tantos dados oficiais do TikTok porque ele não é uma empresa de capital aberto como Google, Meta, Instagram e Snap.

Minhas considerações sobre a reunião de Q4/2022 da Meta

O ano da eficiência:

"O ano da eficiência." E foi assim que Mark Zuckerberg abriu a reunião de acionistas da Meta, o mercado respondeu de forma positiva quase que imediatamente.

A Meta tem planos muito claros de como vai manter a empresa rentável em 2023: cortes na folha de pagamento, redução de camadas de gestão, consolidação de ativos e eliminar projetos que não estejam alinhados com as prioridades da empresa.

Foco em Inteligência Artificial Generativa:

Além da eficiência, ficou evidente o foco da empresa em se tornar uma liderança forte em Inteligência Artificial Generativa, a mesma por trás do ChatGPT.

De acordo com Mark Zuckerberg, a empresa irá direcionar ainda mais recursos para se tornar líder tanto em IA Generativa enquanto continua seus esforços de pesquisa com recomendação baseada em IA.
A Meta já tem uma base de pesquisa em IA incrível que pode ser encontrada em https://research.facebook.com/publications/ e quer expandir ainda mais sua posição como uma das líderes do mundo em IA.

A Inteligência Artificial sempre foi citada nas reuniões da Meta, mas nunca teve o protagonismo que estamos vendo neste momento. Isso mostra um claro reforço das prioridades que foram estabelecidas em 2021.

Reels

Hoje o formato Reels ainda dá prejuízo para a Meta e existe a expectativa de chegar em um ponto neutro no final de 2023 ou início de 2024. Isso acontece porque o formato Reels ainda não tem a mesma vazão e maturidade de monetização dos outros formatos.

Imagine se a cada 3 Reels você fosse impactado com um anúncio, como acontece nos Stories. O processo é gradual e demorado para os padrões do mercado. A Meta enfatiza que eles têm experiência executando este tipo de transição já que isso ocorreu com os Stories também.

Apesar de não termos dados exatos, a Meta reporta que a utilização do Reels dobrou de 2021 para 2022 e o número de compartilhamento de Reels dobrou nos últimos 6 meses. A eficiência da monetização também foi 2x superior a de 2021.

Facebook e Instagram não serão mais os mesmos.

Um dos pontos de grande importância foi a confirmação de que Instagram e Facebook estão passando por uma mudança. Antes as experiências eram baseadas em pessoas e contatos que você conhecia, agora elas estão mudando para incluir conteúdo recomendado pela Discovery Engine (IA de recomendação da Meta).

Um dos gargalos para que isso aconteça rápido é a infraestrutura da Meta, que não era focada em eficiência para algoritmos de IA por exemplo. Durante a reunião, Zuckerberg comentou sobre estarem mudando o processamento de CPUs para GPUs em uma nova estrutura que está sendo implementada nos datacenters da Meta.  

Sobre a recomendação, Zuckerberg estima que 30 a 40% do conteúdo que você vai ver no Instagram e no Facebook podem ser baseados em recomendação. É importante ressaltar que essa é uma estimativa imprecisa e não existe garantia de que este número será este. Muita coisa pode mudar no decorrer do ano, mas de qualquer forma, tem um valor porque é uma estimativa feita pelo próprio Zuckerberg.

Anúncios

Desde 2021 a Meta está reconstruindo a infraestrutura de anúncios utilizando Inteligência Artificial como o grande pilar. Isso permite que a Meta desenvolva produtos amigáveis à privacidade (PETs) e que continuem permitindo com que anunciantes criem anúncios relevantes e segmentados para o público.

No geral, os anúncios tiveram um aumento de conversão de 20% no ano de 2022 quando comparado com 2021. Os anúncios de "clique para mensagem" são responsáveis por um faturamento de $10 bilhões para a Meta, o que é incrível. Nenhum outro formato tem essa performance.

Mensageiros

De acordo com Mark Zuckerberg, hoje Facebook e Instagram são os pilares da empresa e eles querem acrescentar os mensageiros como um próximo pilar no futuro. Nós já estamos vendo algumas iniciativas para monetização do Whatsapp, mas pela reunião fica claro que esse será um dos focos para a Meta expandir a monetização no futuro.

Os avatares do Whatsapp aparentemente foram um sucesso, 100 milhões de pessoas criaram seu avatar e 20 milhões utilizam o avatar como foto no perfil.

Metaverso e anúncio de um novo óculos

Acredito que por conta da pressão do mercado, os dados do Metaverso ficaram totalmente em segundo plano quando comparados com o restante. Apesar de ainda ser um dos pilares de prioridade para a Meta em 2023, foi possível notar que os comentários a respeito do Metaverso foram deixados mais de lado como consequência do foco em Inteligência Artificial e eficiência.

No mais, recentemente em uma entrevista para o New York Times, Mark Zuckerberg afirmou que eles investem apenas 20% no Metaverso e que 80% é direcionado para o carro chefe da empresa, a família de Apps (Facebook, Instagram, Messenger e WhatsApp).

Acredito que faz muito sentido já que o Metaverso foi anunciado como um projeto para 5 a 10 anos.

Mesmo assim, Zuckerberg destaca que existe uma oportunidade e que 200 aplicativos de Realidade Virtual ultrapassam $1 milhão em receita.

De forma bem rápida também foi citado o lançamento de um novo óculos de realidade virtual da Meta para o final do ano. Mark Zuckerberg espera que ele ajude a definir um padrão para o segmento e o óculos também usará o Meta Reality como sistema operacional. No final, ainda aproveitou para reafirmar os planos do óculos de realidade mista.

Considerações finais

O discurso agradou o mercado e foi coerente com o que foi falado nas últimas reuniões.

Eficiência e Inteligência Artificial são as palavras do ano. O foco continua o mesmo com: IA, Metaverso, Mensageiros, Reels e Ads como pilares para a empresa.

O ano de 2023 promete ser uma continuação da execução dos planos iniciados em 2022. Devemos ver cortes de recursos e projetos da plataforma que não estão sendo utilizados e estão consumindo recursos desnecessários do ponto de vista da empresa.

O plano de compra de ações da própria empresa (buyback stocks) com o valor de $40 bilhões deixou o mercado mais confiante e como consequência de todo o conjunto as ações da empresa subiram.

Analisando a apresentação do relatório, senti falta dos comentários sobre as iniciativas relacionadas à transparência, combate a fake news e abuso de uma forma geral na plataforma. Conforme caminhamos para um cenário de regulação de dados no mundo todo e a Meta cresce ainda mais como plataforma, é preciso ter responsabilidade com relação ao conteúdo disponibilizado na plataforma.

O movimento dos mensageiros está consolidado e é muito interessante notar o foco no Whatsapp. Nas últimas reuniões de acionistas o Whatsapp sempre é citado e sempre tem algum destaque, inclusive com cases.

No geral, saldo positivo para a Meta que, em meio a uma nova onda de recessão e mudanças relacionadas à privacidade, se mantém firme como uma das maiores potências do mercado.

Eu sempre acompanho os relatórios financeiros da Meta e divulgo os dados/análise no meu perfil do Instagram.

Acompanhe para ficar atualizado ;)


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